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quinta-feira, abril 10, 2008

MÚSICA E LITERATURA - referências e influências

Depois de um bom tempo sem tempo para postar, resolvi encarar mais uma vez essa jornada e vou comentar uma prática bem curiosa, que espero dar pano pra manga de uma série de postaagens: a referência que alguns compositores e lestristas fazem a textos literários.
a
Exemplos não faltam: desde o nosso Hino Nacional, que se vale de versos de Gonçalves Dias, ao Rock e MPB com diversas outras referências: Renato Russo e sua Legião Urbana, Fagner, Arnaldo Antunes e por aí vai. Muitas vezes trechos desses textos são incluídos na íntegra como parte incidental da música, outras são motivo de inspiração temática.
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Este é o caso da música Canteiros, de Fagner. Inspirada no poema Marcha, de Cecília Meirelles.
Canteiros
Fagner
a
Quando penso em você
Fecho os olhos de saudade
Tenho tido muita coisa
Menos a felicidade
a
Correm os meus dedos longos
Em versos tristes que invento
Nem aquilo a que me entrego
Já me dá contentamento
a
Pode ser até manhã
Cedo, claro, feito o dia
Mas nada do que me dizem me faz sentir alegria
a
Eu só queria ter do mato
Um gosto de framboesa
Pra correr entre os canteiros
E esconder minha tristeza
a
E eu ainda sou bem moço pra tanta tristeza ...
Deixemos de coisa, cuidemos da vida
Senão chega a morte
Ou coisa parecida
E nos arrasta moço
Sem ter visto a vida
a
É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um toco sozinho...
São as águas de março fechando o verão
É promessa de vida em nosso coração
a
Além da referência à Marcha de Cecília ele também usa como música incindental, o que é bem mais comum, o trecho de Águas de Março, de Tom Jobim.
a
Uma coisa que é bem interessante também é que no fim da música, Fagner dá uma alfinetada na vião de mundo pessimista de Cecília, o que é bem incomum. Geralmente se aproveita a idéia para reforçar o tema, não é mesmo?
a
Pois bem, o poema de Cecília é assim:
a
Marcha
Cecília Meireles
a
As ordens da madrugada
romperam por sobre os montes:
nosso caminho se alarga
sem campos verdes nem fontes.
a
Apenas o sol redondo
e alguma esmola de vento
quebram as formas do sono
com a idéia do movimento.
a
Vamos a passo e de longe;
entre nós dois anda o mundo,
com alguns mortos pelo fundo.
a
As aves trazem mentiras
de países sem sofrimento.
Por mais que alargue as pupilas,
mais minha dúvida aumento.
a
Também não pretendo nada
senão ir andando à toa,
como um número que se arma
e em seguida se esboroa,
- e cair no mesmo poço
de inércia e de esquecimento,
onde o fim do tempo soma
pedras, águas, pensamento.
a
Gosto da minha palavra
pelo sabor que lhe deste:
mesmo quando é linda, amarga
como qualquer fruto agreste.
a
Mesmo assim amarga, é tudo
que tenho, entre o sol e o vento:
meu vestido, minha música,
meu sonho e meu alimento.
a
Quando penso no teu rosto,
fecho os olhos de saudade;
tenho visto muita coisa,
menos a felicidade.
a
Soltam-se os meus dedos ristes,
dos sonhos claros que invento.
Nem aquilo que imagino
já me dá contentameno.
a
Como tudo sempre acaba,
oxalá seja bem cedo!
A esperança que falava
tem lábios brancos de medo.
O horizonte corta a vida
isento de tudo, isento...
Não há lágrima nem grito:
apenas consentimento
a
O engraçado é que muita gente pensa que Fagner musicou o poema de Cecília, o que se vê que não é verdade. Poemas musicados até é outra categoria de referências que também quero colocar aqui, já que tem muitos bem legais (e outros beeeeeeem forçados também, né?!). O fato é que não é este o caso.
a
Nos próximos posts, se nenhum outro assunto cair de pára-quedas aqui, vou continuar escrevendo sobre essas referências.

Um comentário:

C. disse...

ótimo tema!
me divirto procurando essas referências e inspirações, seja em livros, filmes, seriados, músicas...
lembro do meu espanto, estudando literatura no ano do vestibular, ao sacar as referências a Bandeira e a Ferreira Gullar na música de Adriana Calcanhotto =P


sugestões:

-Poemeto erótico, manuel bandeira: inspirou uma música muuuito conhecida, que já tem uns anos. e, por puro preconceito, acho que ninguém imagina que tem pedaço de poesia por ali...

Diga a ela, música de Nenhum de nós: inspirada numa poesia d'um poeta brasileiro..

-Zeca Baleiro também vai buscar muita inspiração na literatura.

Divirta-se tentando descobrir!


*tira essa verificação de palavras. é um saco.